Ana Mendieta | Silhueta em Fogo

SESC Pompeia, São Paulo, SP 

2023 

Produção Executiva 

Curadoria: Daniela Labra

“O fogo sempre foi uma coisa mágica para mim” – Ana Mendieta

A exposição histórica Ana Mendieta – Silhueta em Fogo apresenta uma seleção de obras fílmicas de Ana Mendieta (Havana, 1948-Nova York, 1985) realizadas entre 1972 e 1981. Exibimos 21 filmes originalmente criados nos formatos Super 8, 16 mm e Betacam, restaurados e digitalizados, incluindo uma nova cópia do filme Black Angel, bem como fotografias que mostram a progressão de suas obras, imagens em preto e branco em grandes formatos, e a escultura de velas Ñañigo Burial.

 

A artista é uma figura central na arte do final do século XX por sua obra transcultural, atemporal, intrinsecamente política e revolucionária. Informada pela arte conceitual, land art, arte processual, feminista e performativa nos Estados Unidos dos anos 1970-1980, sua poética é definida por um desejo de fusão com a terra em busca de origens ancestrais e, hoje, está também ligada à estética, declarações políticas e tradições de comunidades marginalizadas.

 

Em 1961, Mendieta e a sua irmã mais velha chegam aos Estados Unidos por meio da Operação Peter Pan, patrocinada pelo governo dos EUA e pela Igreja Católica – haviam sido enviadas por seus pais, opositores ao regime de Fidel Castro, preocupados com a segurança das filhas. Radicada em Iowa, Ana completou os estudos e licenciou-se em pintura pela Universidade de Iowa. Frequentou aulas de antropologia e visitou o México, cujas referências pré-colombianas e celebrações funerárias inspiraram sua iconografia da Árvore da Vida. Concluiu o mestrado e inscreveu-se no Programa de Estudos em Intermídia, onde expandiu sua radicalidade visual. Filmou com Super 8 e conheceu artes primevas em viagens pelos EUA, Cuba e Europa; apreciava arte egípcia e a cultura pop como o cinema, e incorporou referências visuais religiosas católicas, indígenas e afro-cubanas.

 

Em 1973, no sítio arqueológico de Yaagul, a artista cobriu-se de grama e pequenas flores brancas em um sepulcro, iniciando a Série Siluetas. Até 1976, inseria-se fisicamente nas obras, em ações que não chamava de performances. Na natureza, criou figuras humanas arquetípicas com fogo, pólvora e queimas, explorando a estética da combustão, símbolos de cura e a transmutação da matéria. Desenhou e esculpiu com flores, lama, folhas, água, sangue, penas, têmpera, areia, pedras. Documentou com fotografias, slides, filmes e vídeos as suas intervenções em leitos de rios, praias, falésias, parques, cemitérios e jazigos arcaicos.

 

Em 1978, Mendieta muda-se para Nova York, aproximando-se de artistas feministas e da comunidade latina. Entre 1980 e 1983, visitou Cuba várias vezes. Criou filmes, fotografias de grande formato em preto e branco e, nos anos seguintes, objetos com materiais orgânicos, centenas de desenhos e projetos públicos, nem todos realizados.

 

Ana Mendieta faleceu em setembro de 1985. Nas décadas posteriores, sua obra se internacionalizou e foi catalogada, circulando principalmente em retrospectivas nos Estados Unidos e na Europa, além do México. No Brasil, a 27ª Bienal de São Paulo exibiu alguns de seus filmes e fotografias. Sua linguagem transdisciplinar e vital se atualiza no cruzamento de elementos culturais e processos históricos brasileiros, cubanos e norte-americanos, e na evocação de temas como o pensamento ecofeminista e a noção de futuros ancestrais dos povos originários. Neste evento, partilhamos mais do gesto enérgico de Ana Mendieta. Para ela, a arte era, acima de tudo, a sua própria existência e o meio pelo qual restabelecia os elos que a ligavam ao Universo.